A libertação de Eustáquio

O livro As crônicas de Nárnia, apesar da aparente inocência infanto-juvenil, possui um extraordinário potencial didático, capaz de instruir pessoas de todas as idades. Não por acaso, por tratar em suas entrelinhas de profundas questões antropofilosóficas, muitos estudiosos aventuraram-se na análise do aspecto pedagógico desta obra encantadora de C.S. Lewis.

Somente no conto "O Leão, a Feiticeira e o Guarda-Roupa" podemos observar profundos insights sobre variados assuntos, como, por exemplo, a Graça redentora, a busca humana por reconciliação, a lógica do bem e do mal, exemplos de virtudes e vícios, crítica contra o racionalismo e outros temas que fazem alusões a ensinamentos bíblicos.

Uma das metáforas didáticas mais significativas encontra-se no terceiro livro da série "A viagem do peregrino da alvorada". Lewis mostra de forma vívida, através da vida do personagem Eustáquio, o quão tolas e vãs são as nossas tentativas de mudarmos a nós mesmos sem o auxílio do poder divino.

Eustáquio é um garoto ganancioso e arrogante, que transforma-se em um dragão, retrato de seu cáracter adulterado. Porém, ele acaba sendo forçado a perceber seu estado deplorável e tenta desesperadamente voltar a ser menino. Ele chora, trabalha arduamente, se esforça para comporta-se de forma exemplar, mas apesar de tudo, nada muda a sua "pele de dragão". Cada vez que esfregava-se para fazer sua pele de dragão cair, uma nova camada aparecia. Depois de várias tentativas, desiludido, ele desiste.

Algo começa a mudar quando o desesperado Eustáquio encontra-se com Aslam, o leão, a figura de Cristo em Nárnia. Aslam disse para Eustáquio: "Eu tiro sua pele". Traduzindo em termos teológicos seria: Aprenda crente Eustáquio, que SOU EU que mudo sua natureza pecaminosa; entenda de uma vez por todas que não há poder em seus atos de justiça, e que se você continuar confiando em seu mérito próprio, mais "monstrificado" você fica. Abandone Eustáquio, sua confiança em si mesmo, nestes códigos de leis inventadas por homens que só produzem orgulho, e se renda de vez ao poder regenerador do Espírito Santo. Então o processo de revolução interior começa. Eustáquio nos conta como é doloroso este processo:

Tinha muito medo daquelas garras, mas, ao mesmo tempo, estava louco para ver-me livre daquilo. Por isso me deitei de costas e deixei que ele tirasse a minha pele. A primeira unhada que me deu foi tão funda que julguei ter me atingido o coração. E quando começou a tirar a pele senti a pior dor da minha vida

Aslam foi além, tirou a pele pecaminosa, jogou o menino na água da purificação e o vestiu com roupas novinhas em folha. E assim concluiu C.S. Lewis:

Seria bonito e muito próximo da verdade dizer que, dali por diante, Eustáquio mudou completamente. Para ser rigorosamente exato, começou a mudar. Às vezes, tinha recaídas. Em certos dias era ainda um chato. Mas a cura havia começado.


Fonte: Daniel Grubba, Soli Deo Gloria

Nenhum comentário:

Postar um comentário